Os Impulsos Vitais” (Triebe ou Instinkte)

Os Impulsos Vitais” (Triebe ou Instinkte)

Em Nietzsche, os “impulsos vitais” (Triebe ou Instinkte) são as forças primordiais que constituem a essência da vida humana, associadas à vontade de poder (Wille zur Macht), à criatividade, à afirmação da existência e à superação de si. Quando ele critica a cultura ocidental por “desprezar os impulsos vitais”, refere-se à repressão sistemática dessas forças por meio da moral, da religião, da filosofia e da ciência.

Abaixo, descrevo os principais impulsos vitais que Nietzsche considera reprimidos ou distorcidos:


1. O Impulso de Dominação e Hierarquia (Vontade de Poder)

  • O que é: A tendência natural de expandir influência, criar valores e impor forma ao caos.
  • Como foi reprimido:
    • Pela moral cristã (“amar os fracos”, “virar a outra face”).
    • Pelo igualitarismo moderno (democracia, socialismo), que nega diferenças naturais.
  • Exemplo: Um grande artista ou líder, em vez de impor sua visão, é forçado a se submeter a normas coletivas.

2. O Impulso Criador e Artístico

  • O que é: A capacidade de inventar novos valores, mitos e formas de vida.
  • Como foi reprimido:
    • Pela racionalidade socrática (a verdade como algo abstrato, não como criação).
    • Pela burocratização da cultura (arte como entretenimento, não como transfiguração da vida).
  • Exemplo: A filosofia platônica despreza a arte como “cópia da cópia”, em vez de celebrá-la como força dionisíaca.

3. O Impulso Sexual e Corporal

  • O que é: A celebração do corpo, dos desejos e da sensualidade como parte da saúde.
  • Como foi reprimido:
    • Pelo ascetismo cristão (“a carne é pecaminosa”).
    • Pela medicalização da sexualidade (Freud, por exemplo, vê o desejo como patologia a ser controlada).
  • Exemplo: A culpa sexual na moral judaico-cristã, em contraste com a celebração grega de Eros.

4. O Impulso Agressivo e Guerreiro

  • O que é: A capacidade de conflito, disputa e autoafirmação violenta (não como crueldade gratuita, mas como afirmação de força).
  • Como foi reprimido:
    • Pelo pacifismo moderno (“violência é sempre errada”).
    • Pela domesticação do homem pelo Estado e leis.
  • Exemplo: O guerreiro homérico (Aquiles) é substituído pelo “homem bom” cristão (humilde, submisso).

5. O Impulso Dionisíaco (Êxtase e Dissolução)

  • O que é: A embriaguez, o caos criativo, a fusão com a natureza.
  • Como foi reprimido:
    • Pela racionalidade apolínea (ordem, lógica, moderação).
    • Pela moralidade que condena o excesso (bebida, festa, experiências-limite).
  • Exemplo: As festas dionisíacas na Grécia antiga vs. a repressão puritana do prazer.

6. O Impulso de Solidão e Independência

  • O que é: A necessidade do indivíduo superior de se afastar do rebanho.
  • Como foi reprimido:
    • Pelo coletivismo (“o grupo sempre sabe melhor”).
    • Pela condenação do egoísmo (enquanto Nietzsche o vê como virtude do criador).
  • Exemplo: O filósofo livre (como Nietzsche imagina Zaratustra) é visto como “louco” pela massa.

Conclusão

Para Nietzsche, esses impulsos não são “maus” em si – são a própria expressão da vida. O problema é que a cultura ocidental os patologizou, transformando-os em algo a ser controlado, negado ou sublimado. A moral escrava (cristianismo, democracia, racionalismo) triunfou porque os fracos conseguiram convencer os fortes de que seus instintos eram errados.

A superação disso exigiria uma transvaloração de todos os valores, onde o homem superior (Übermensch) pudesse afirmar seus impulsos vitais sem culpa.

Fontes principais:

  • Assim Falou Zaratustra (a crítica à moral do rebanho).
  • A Genealogia da Moral (a inversão de valores pelo sacerdote asceta).
  • O Nascimento da Tragédia (a tensão entre Apolo e Dionísio).

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